O dia vai chegando ao fim da mesma forma como começou:
triste e vazio. Nos últimos anos, tem sido sempre assim. Não importa se o sol
surgiu para expulsar as nuvens que perduravam há uma semana, não importa que o
vento pareça refrescante para um fim de primavera; o sentimento é sempre o
mesmo.
Pergunto-me incessantemente como outros conseguem lidar com
a morte de uma forma satisfatória. Como conseguem superar a perda, a separação?
Sei que é ingenuidade de minha parte, um misto de esperança e superstição, mas
não consigo me livrar da expectativa de uma conexão. Olho repetidamente para a
lápide, para a data cruel que marcou a destruição de nossa família, e para o
restante do cemitério à minha volta. Vejo muitos visitantes, indo e vindo, mas
espero ver algo mais. Espero ver aquele semblante reconfortante por quem nutri
tanto amor.
Afinal, não é Dia de Finados? Não parece justo que pessoas
separadas pela morte tenham uma chance de um reencontro neste dia? Carrego a
frustração desta data de anos anteriores, mas ela não é suficiente para me
tirar a esperança. Talvez hoje seja diferente. Talvez hoje eu tenha sorte. Só
preciso ficar aqui mais um tempo, de braços abertos para um possível encontro.
Mesmo notando que o sol já está se pondo e a noite se aproxima.
As noites. As noites são a pior parte. Se pelo menos eu
tivesse a dádiva de uma visita. Só hoje. Um único momento, por mais breve que
fosse, me traria uma satisfação enorme e me daria forças para encarar a noite.
Mas a luz do dia desaparece por completo, trazendo-me a certeza da solidão.
E até mesmo essa me abandona com a chegada da noite. Um a
um, os visitantes vão embora e os portões são fechados. Sinto todas aquelas
terríveis presenças, já familiares, ao meu redor. A noite chegou e, com ela,
chegaram as almas dos malditos para me atormentar mais uma vez. E assim como
nos anos anteriores, nenhum visitante veio por mim.