terça-feira, 6 de novembro de 2018

Dia de Finados


O dia vai chegando ao fim da mesma forma como começou: triste e vazio. Nos últimos anos, tem sido sempre assim. Não importa se o sol surgiu para expulsar as nuvens que perduravam há uma semana, não importa que o vento pareça refrescante para um fim de primavera; o sentimento é sempre o mesmo.
Pergunto-me incessantemente como outros conseguem lidar com a morte de uma forma satisfatória. Como conseguem superar a perda, a separação? Sei que é ingenuidade de minha parte, um misto de esperança e superstição, mas não consigo me livrar da expectativa de uma conexão. Olho repetidamente para a lápide, para a data cruel que marcou a destruição de nossa família, e para o restante do cemitério à minha volta. Vejo muitos visitantes, indo e vindo, mas espero ver algo mais. Espero ver aquele semblante reconfortante por quem nutri tanto amor.
Afinal, não é Dia de Finados? Não parece justo que pessoas separadas pela morte tenham uma chance de um reencontro neste dia? Carrego a frustração desta data de anos anteriores, mas ela não é suficiente para me tirar a esperança. Talvez hoje seja diferente. Talvez hoje eu tenha sorte. Só preciso ficar aqui mais um tempo, de braços abertos para um possível encontro. Mesmo notando que o sol já está se pondo e a noite se aproxima.
As noites. As noites são a pior parte. Se pelo menos eu tivesse a dádiva de uma visita. Só hoje. Um único momento, por mais breve que fosse, me traria uma satisfação enorme e me daria forças para encarar a noite. Mas a luz do dia desaparece por completo, trazendo-me a certeza da solidão.
E até mesmo essa me abandona com a chegada da noite. Um a um, os visitantes vão embora e os portões são fechados. Sinto todas aquelas terríveis presenças, já familiares, ao meu redor. A noite chegou e, com ela, chegaram as almas dos malditos para me atormentar mais uma vez. E assim como nos anos anteriores, nenhum visitante veio por mim.